Aos 90 anos, Walter Orthmann é o brasileiro que trabalha há mais tempo na mesma empresa |
Durante sua carreira, o gerente de vendas catarinense Walter Orthmann
recebeu seu salário mensal em oito moedas diferentes, foi chefiado por
12 diretores-executivos e mudou de cargo quatro vezes. Mas desde 1938
não alterou o nome da empresa empregadora na carteira de trabalho.
Aos 90 anos, Orthmann é o brasileiro que trabalha há mais tempo na
mesma companhia, segundo o RankBrasil, uma versão brasileira do livros
dos recordes.
No último dia 17 de janeiro, o catarinense superou o próprio recorde e
completou 75 anos de Renauxview, uma empresa têxtil de Brusque (SC). E
não pretende deixar o cargo e a empresa tão cedo – seu contrato de
trabalho expira só em 2021 e ainda pode ser renovado.
Orthmann começou sua longeva relação com a companhia aos 15 anos
quando assumiu o cargo de funcionário da expedição. Levava uma hora para
chegar ao trabalho. O caminho, sem asfalto, era feito a pé. Durante
nove meses, das 6h às 18h, a rotina foi “enrolar, empacotar e colocar
etiquetas nos tecidos”. O salário inicial era de 100 mil réis. Todo
dinheiro, até os 21 anos de idade, foi para as mãos do pai dele.
Depois disso, virou estafeta (ou o que chamamos hoje de office boy)
e, meses depois, foi para o setor de faturamento. “Tudo era manual, nem
máquina de calcular existia”, conta.
Em 1955, começou a trabalhar no departamento comercial da companhia,
onde descobriu sua verdadeira paixão: vender. Para conquistar bons
pedidos, Orthmann encarava até dois dias de estrada (muitas vezes, de
terra) para chegar a outros estados, como São Paulo e Rio de Janeiro.
O trajeto era feito de ônibus, a princípio. Depois, de avião. “O
piloto, às vezes, tinha que voltar para o aeroporto e dizia que tinha
esquecido o plano de voo para não ter que falar que o avião tinha dado
um problema”, lembra.
De Porto Alegre a Manaus, a vida profissional era visitar lojas e
confecções. Anotava tudo na, até hoje, onipresente agenda de papel:
“Você nunca pode deixar de responder uma coisa que prometeu. Por isso,
tem que anotar tudo para jamais esquecer”, diz revelando ser este o seu
segredo para conquistar clientes leais.
Contagem regressiva para a segunda-feira
A aposentadoria veio em 1978, mas não hesitou diante da possibilidade de continuar no emprego. E pede para a reportagem nem falar sobre a ideia de “parar de trabalhar”. Só de pensar nisso já fica “nervoso”, brinca.
A aposentadoria veio em 1978, mas não hesitou diante da possibilidade de continuar no emprego. E pede para a reportagem nem falar sobre a ideia de “parar de trabalhar”. Só de pensar nisso já fica “nervoso”, brinca.
“Se você parar, espera o quê? A morte? Porque você vai morrer”, diz.
“Se fico em casa, durmo até nove, dez horas. Dói aqui, dói lá. Já acho
demais sábado e domingo. Só tiro férias porque me obrigam”.
Roberto Sander, diretor de marketing da Renauxview confirma isso. “No
último aniversário do seu Walter, a esposa dele pediu para não darmos
mais férias, porque ele fica doente”, conta.
Por outro lado, oportunidades para sair do emprego não faltaram. “Eu
pensei: estou tão bem aqui, gosto do que faço, vivi muito bem este tempo
todo, por que vou me mudar?”, conta.
“Um vício que eu não quero”
No expediente, que dura das 8h às 17h, nada de computador. Os pedidos
são todos escritos à mão ou na máquina de datilografia em folhas de
papel carbono. Depois, segundo Sander, são digitalizados por uma das
secretárias da empresa.
Isso não significa que ele não entenda de tecnologia. Quando quer
saber alguma coisa nova, faz consultas na internet, mas “sem espalhar
nada”. Segundo ele, computador é um vício. “Quem pega, vicia mesmo. Não
quero aqui na fábrica. Não faz bem para a vista, cansa e tudo o que eu
preciso já está na minha agenda”, afirma.
O trajeto para o trabalho é percorrido de carro – que ele mesmo
dirige. Todos os dias, seu Walter almoça em casa. “Quando o chamo para
uma reunião às 11h30, ele já lembra que pode perder a sobremesa em
casa”, brinca o sócio-diretor da empresa.
No ano passado, passou o equivalente a três meses e meio viajando
para visitar clientes em cidades do Sudeste e Nordeste. Segundo os
diretores da companhia, muitos só aceitam ser atendidos por ele.
“A motivação dele é o trabalho. A adrenalina é o pedido tirado”,
afirma Armando Hess De Souza, sócio-diretor da Renauxview, que conheceu o
seu Walter por volta dos 5 anos de idade em uma das visitas à empresa
com a mãe, dona Adelina, fundadora da camisaria Dudalina.
Depois do expediente
Os 75 anos de trabalho duro não impedira Orthmann de viver a vida. Casou-se aos 24 anos, teve cinco filhos. Ficou viúvo aos 55. Três anos depois, casou-se com uma moça de 27 anos com quem teve dois filhos. O mais novo, Marcelo, tem 19 anos e acabou de começar um estágio na área de compras da Renauxview.
Os 75 anos de trabalho duro não impedira Orthmann de viver a vida. Casou-se aos 24 anos, teve cinco filhos. Ficou viúvo aos 55. Três anos depois, casou-se com uma moça de 27 anos com quem teve dois filhos. O mais novo, Marcelo, tem 19 anos e acabou de começar um estágio na área de compras da Renauxview.
Por muito tempo, jogou vôlei, basquete e boliche. Hoje, dedica-se
todas terças e quintas-feiras à canastra (um tipo de jogo de cartas). A
jogatina segue até a meia-noite.
Entre suas filosofias de trabalho, além de anotar tudo o que promete
ao cliente, está não discutir com os patrões e, principalmente, amar o
que se faz durante o expediente. “Eu não posso ser exemplo para um
jovem, cada um tem que saber o que gosta de fazer e se empenhar nisso”,
diz.
By Revista Alfa
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